1. Concordo que o principal foco do problema da distribuição de royalties está na esfera municipal e que poderíamos ter começado as mudanças por aí, mas infelizmente o governo estadual do Rio fez uma aliança com os municípios petrorentitas (Campos e cia) para que nenhuma regra atual fosse alterada.
2. Concordo também que se faça uma discussão mais ampla sobre outros royalties e inclusive sobre o ICMS, mas não acho que devamos esperar por uma reforma ampla que nunca ocorre e deixar de fazer as mudanças possíveis neste ano. Como não achava que devíamos ter desistido de aprovar a reforma tributária em 2009 só porque ela não era a ideal. As oportunidades aparecem e nós continuamos desperdiçando.
3. No caso do ICMS, além disso, acho que a mudança almejada é no sentido de torná-lo um imposto puramente sobre o consumo e não o contrário, como pleiteia o RJ. O justo e usual em todo o mundo é que impostos tipo IVA sejam aplicados sobre o consumo e retornem ao local onde vivem os cidadãos que pagaram por eles.
4. Por outro lado, há um mito sobre a magnitude das perdas do RJ com o ICMS dos combustíveis. Isso porque o RJ não é hoje o maior produtor de combustível e sim SP. Uma coisa é extração de petróleo, que não gera ICMS; outra é produção de combustível, esta sim tributada.
5. Outro problema é que, embora o ICMS dos combustíveis seja dos estados consumidores, o valor adicionado dos municípios com refinarias é o critério para divisão do ICMS entre as prefeituras, o que acaba reforçando a concentração de recursos em alguns municípios que também recebem royalties. O critério de distribuição do ICMS entre os municípios é tão ou mais grave que o dos royalties - vide Paulínea (SP).
6. É verdade que as práticas de má gestão não são prerrogativa de municípios bem remunerados com royalties ou com ICMS, mas o excesso de receitas pode sim incentivar o desperdício e a corrupção. Não sou eu que estou inventando isso. Existe toda uma literatura econômica internacional sobre isso, inclusive usando o case do Brasil (ver o recente paper da Fernanda Brollo com Roberto Perotti e o Guido Tabellini sobre "The Political Resource Curse"). E mais do que literatura: Campos é a prova viva disso.
7. As suas colocações sobre os critérios de aplicação dos royalties são muito importantes e de fato, como o Mateus Bandeira também havia assinalado em e-mail para mim nesta semana, esta é uma questão que não está se discutindo na atualidade. Eu acho que, embora parte dos recursos dos royalties devessem ser redistribuídos entre todos, a maior parte da receita hoje reservada a estados e municípios deveria ser destinada a um fundo nacional, como ficou definido para as receitas da União.
8. Porém, tenho dúvidas sobre a validade de se continuar proibindo o gasto dos royalties em despesas de pessoal. O espírito da proposta (incentivar investimentos) é correto, mas o resultado não deu muito certo. Além disso, se construímos escolas com os royalties, precisamos contratar professores e comprar material escolar. O problema é evitar desvios para outros gastos correntes "improdutivos".
9. Assino embaixo de suas críticas ao modo como os royalties estão sendo utilizados pelo governo do RJ, cobrindo despesas com inativos e pensionistas e não sendo capitalizados pelo fundo de previdência. Mas esse é o problema: o RJ tornou-se dependente em demasia dos royalties e hoje não pode sobreviver sem eles.
10. Isso é que está errado. Recomendo a todos lerem uma monografia do Nelson Leitão, auditor da Receita, que foi premiado pela Secretaria de Fazenda do Rio de Janeiro em 2009 por um trabalho sobre o gap tributário do ICMS, onde ele mostra como o RJ é um dos estados que menos explora as suas bases tributárias convencionais (excetuando combustíveis, energia e comunicações). Ou seja, a fartura de royalties fez os últimos governos do RJ a exagerarem nos benefícios fiscais, descuidando de sua arrecadação própria ou concentrando todo o esforço arrecadatório nas três bases mencionadas.